Um brilhante artigo inspirado no livro Ação Afirmativa ao Redor do Mundo – Um estudo empírico sobre cotas e grupos preferenciais, de Thomas Sowell! “Quando a realidade fala mais alto que as alegadas boas intenções” – escrito com exclusividade para o blog É Realizações por Paulo Cruz:
Licenciado em Filosofia, mestre em Ciências da Religião pela Universidade Metodista de SP e agraciado com a Ordem do Mérito Cultural, do MinC, em 2017. É professor de filosofia da rede pública do estado de São Paulo.
O debate racial nunca esteve tão em alta na sociedade brasileira. As políticas de ações afirmativas, e sua menina dos olhos, as cotas, geram disputas apaixonadas nas redes sociais e nas salas de aula das universidades.
De um lado, o pseudoconceito de “dívida histórica” – segundo o qual os descendestes dos antigos senhores de engenho são indiretamente responsabilizados pela escravidão dos descendentes de africanos – é alardeado como verdade incontestável; a vantagem equitativa é celebrada como uma oportunidade ímpar de ascensão social; a quantidade de negros nas universidades tem sido usada como garantia de um futuro promissor a esse grupo, historicamente inferiorizado quando o assunto é poder aquisitivo e aceitação social; e, por fim, o suposto alto rendimento dos cotistas tem servido como prova do sucesso de tais políticas.
E do outro lado? Bem, do outro lado temos a realidade.
De acordo com o último Censo, realizado em 2010, o Brasil é um país majoritariamente mestiço. A soma de pretos e pardos – que compõem a classificação Negros, do IBGE – resulta em mais de 50% da população brasileira.
Mas há um dado curioso: destes 50%, somente 7,6% são pretos. Ou seja, só esse número já seria o suficiente para aceitarmos a baixa quantidade de pretos nas universidades.
Se incluirmos os pardos na estatística, teremos de considerar o critério obtuso da autodeclaração, e o problema aumenta exponencialmente – tanto é que, como não são raros os casos de pessoas de pele clara que se autodeclaram negras para serem admitidas, foram criadas, em algumas universidades federais e concursos públicos, entrevistas (chamadas pejorativamente de tribunais raciais) nas quais a negritude do candidato pode ser confirmada – por critérios assaz questionáveis, diga-se – e, também, para evitar possíveis fraudes.
Não é preciso dizer os problemas que isso tem causado no processo.
Mas não é isso que está em jogo.
O problema não é a plausibilidade de um sistema frágil e duvidoso, mas a intenção por detrás dele. Ou seja, não é uma questão lógica, mas ideológica.
E é por isso que o livro Ação Afirmativa ao Redor do Mundo, de Thomas Sowell, é de fundamental importância.
Sowell, renomado economista, sênior do Instituto Hoover, na Universidade Stanford, é um negro que vai na contramão do discurso oficial dos defensores das políticas de ações afirmativas.
Formado em Economia pela Universidade Harvard (1958), com mestrado pela Universidade de Columbia (1959) e doutorado pela Universidade de Chicago (1968), Sowell é um experiente pesquisador dos malefícios das políticas de ações afirmativas não só nos Estados Unidos, mas em diversos países.
Seu livro é fruto de mais de 30 anos de pesquisas, cujo resultado é um profundo diagnóstico – com dados empíricos e estatísticos comparados – do prejuízo que tais políticas causaram a seus supostos beneficiados.
Está gostando da resenha de Paulo Cruz? A revista Veja também publicou uma longa matéria quando Ação Afirmativa ao Redor do Mundo foi publicado no Brasil. Para acessá-la, é só clicar aqui!
A adoção e os resultados das políticas de ações afirmativas em cinco países – Nigéria, Índia, Sri Lanka, Malásia e EUA – são investigados a fundo por Sowell, desnudando uma verdade bastante inconveniente: a implementação das políticas “tende a ser debatida em termos de suas justificativas e objetivos, e não de suas consequências reais” (p. 174).
Ou seja, os resultados desastrosos não são levados em consideração; uma vez instalada, toda a teorização a respeito de sua efetividade se torna ideológica.
Por exemplo, a Índia – a sociedade mais multiétnica (e fragmentada) do mundo – é o país com as mais antigas políticas de ações afirmativas; elas foram iniciadas ainda na colonização inglesa, e se tornaram oficiais em 1947.
Um Censo realizado em 1991, no entanto, mostrou algo com o que os proponentes das cotas talvez não contassem: entre aqueles a quem as políticas se dirigem, os membros das castas mais baixas não são beneficiados pelo sistema, pois sequer chegam a ele; e, quando chegam, muitos desistem em meio às dificuldades.
As políticas de ações afirmativas acabam por privilegiar, infelizmente, os mais afortunados entre os menos afortunados.
Como afirma Sowell: “Mesmo quando o governo proporciona educação primária gratuita, os custos dos livros e do restante do material escolar podem não estar dentro das possibilidades das pessoas muito pobres” (p. 52).
Nos EUA, Sowell nos mostra que o número altíssimo de evasões nunca é levado em consideração nos debates acerca da eficiência do sistema de cotas. Negros com qualificação inferior são admitidos em universidades cuja exigência é altíssima, e simplesmente não conseguem se formar.
Como diz Sowell, “a questão central, no entanto, não é quantos negros estão no campus em dado momento, mas quantos efetivamente se formam” (p. 212).
No Brasil não temos esse problema. Com a falência total do ensino, e com os estudantes brasileiros – talvez até mesmo os professores, se submetidos a um teste similar – ocupando os mais baixos níveis nos exames internacionais, não é difícil um cotista entrar em uma universidade federal e ter um desempenho razoável; afinal de contas, se a capacidade diminui, a exigência deve seguir o mesmo caminho, haja vista a quantidade alarmante de analfabetos funcionais que frequentam as nossas universidades.
Porém, mesmo a nossa situação sendo muito diferente da que encontramos entre os americanos, os proponentes das políticas de ações afirmativas se igualam em um ponto: não é da realidade concreta que eles estão falando. Tanto é verdade que o teor revolucionário dos movimentos defensores de cotas raciais é algo bastante curioso.
Não raro, a tentativa de impor suas pautas com palavras de ordem – Cota é pouco, vocês nos devem até a alma! – ao restante da sociedade e da comunidade acadêmica é carregada de uma pretensa busca por direitos, que, no fundo, não passa de ódio ideológico.
E o leitor atento do livro de Sowell não sentirá dificuldades para fazer as transposições necessárias que caibam em nossa peculiar experiência.
Por isso, o livro Ação Afirmativa ao Redor do Mundo é um farol que ilumina a experiência de outros países e nos oferece subsídios para analisar a situação brasileira de modo bastante eficaz. Sendo assim, boa leitura!
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Ação Afirmativa ao Redor do Mundo – Um estudo empírico sobre cotas e grupos preferenciais
Artigo excelente! Só informação de qualidade, meus parabéns ao autor (a), é esse tipo de informação que me leva a ler todos os dias temas como este.