Entrevista feita por Sébastien Lapaque
Tradução: Pedro Sette-Câmara
Publicado em Le Figaro em 4/1/2019.
Edson Filho, editor e diretor da É Realizações, editora em São Paulo, lançou em 2010 um programa de tradução integral das obras do escritor francês Georges Bernanos, exilado por sete anos no Brasil. Um acontecimento celebrado por todos.
O ambicioso programa de publicação no Brasil da íntegra da obra de Georges Bernanos pela É Realizações marca uma volta do escritor ao país onde ele morou entre 1938 e 1945. Como você explica isso?
EDSON FILHO: Lançamos nossa Coleção Georges Bernanos em 2010. À época, existia em certos meios uma espécie de desprezo por esse autor, estritamente associado à literatura católica.
Para tirá-lo desse isolamento e encontrar um novo público leitor para ele, decidi recordar as duas obras-primas cinematográficas inspiradas por sua obra, ao publicar Diário de um Pároco de Aldeia e Nova História de Mouchette com capas ilustradas por imagens dos filmes de Robert Bresson. Os primeiros a se surpreender no Brasil foram os admiradores do cineasta.
E conseguimos atrair o interesse da imprensa, conseguimos que Georges Bernanos fosse comentado nos jornais. Publicamos também, além desses livros, Sob o Sol de Satã, levado para as telas por Maurice Pialat.
São edições ou reedições?
EDSON FILHO: Sob o Sol de Satã foi republicado na tradução antiga de Jorge de Lima, grande poeta modernista brasileiro, que foi amigo de Georges Bernanos. A tradução de Diário de um Pároco de Aldeia é de Edgar de Godoi da Mata-Machado, também ligado ao escritor durante seus sete anos de exílio no Brasil. Porém, todo o restante de sua obra está sendo traduzido.
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Na época em que o escritor morava aqui, seus admiradores o liam em francês, principalmente graças a seu editor, Charles Ofaire, o primeiro a publicar Monsieur Ouine, no Rio de Janeiro, em 1943, pela Atlântica Editora.
Começamos por Nova História de Mouchette e continuamos com Diálogos das Carmelitas, acontecimento importante no Brasil. Em 2013, publicamos em seguida Joana, Relapsa e Santa e Um Sonho Ruim. Sempre com o mesmo sucesso.
Depois dos romances, você decidiu, então, passar aos escritos de combate?
EDSON FILHO: Sim, publicamos Os Grandes Cemitérios sob a Lua em 2015 e A França contra os Robôs em 2018. Esses livros vendem muito bem ao público familiarizado com nossa editora, a qual publica muitos livros de filosofia e de ciências humanas, destacando-se as obras de Louis Lavelle, de Michel Henry e de René Girard.
Com essas obras, Georges Bernanos sem dúvida encontra leitores diferentes dos leitores de seus romances, dos quais o mais popular hoje no Brasil é Diário de um Pároco de Aldeia, que os professores gostam de dar para os alunos na escola e na universidade.
Ao mesmo tempo antigo e moderno, de direita e de esquerda, tradicional e revolucionário, católico e crítico, sua forte voz fazia falta no Brasil. Sobretudo nos momentos difíceis que nosso país hoje atravessa. Ela dá liga com muitas coisas aqui.
Os brasileiros sabem que Georges Bernanos deixou páginas maravilhosas sobre seu país?
EDSON FILHO: Não, mas vão descobrir com a publicação de Carta aos Ingleses e de As Crianças Humilhadas. Porque nossa ambição é editar a totalidade de sua obra no Brasil, incluindo O Grande Medo dos Bem-Pensantes. As traduções de A Alegria e de A Impostura estão prontas, assim como a de Liberdade para Quê?
Quando os brasileiros lerem Carta aos Ingleses e ouvirem Georges Bernanos lhes dizer
O seu povo cresce como uma árvore, ou se compõe como um poema, por uma espécie de necessidade interior, da qual o mundo moderno não entende absolutamente nada porque, precisamente, ele não tem necessidade interior
é inevitável que eles se comovam ao descobrir que um dos gênios da literatura universal, um escritor que tem seu lugar entre os maiores, tenha encontrado palavras tão justas para evocar seu país, cujas profundezas ele conheceu num momento em que a Europa ocupada talvez parecesse um inferno, e o Brasil, uma espécie de paraíso perdido.
O público ainda precisa descobrir também Monsieur Ouine, seu último romance, concluído em Pirapora, às margens do Rio São Francisco, em maio de 1940. É preciso lembrar que a história de Georges Bernanos e a de sua obra estão intimamente ligadas à história do Brasil.
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Belíssima entrevista. Parabéns pelo virtuoso trabalho editorial, e aguardando ansioso pelas próximas obras do mestre Bernanos.
Estou animado! Kkkk