“O retiro é o laboratório do espírito”, escreve A.-D. Sertillanges, em A Vida Intelectual.
É curioso que esta frase jogue luz em um dos maiores paradoxos de nosso tempo: falar de contemplação quando redes sociais e grupos dos quais somos obrigados a participar exigem que tenhamos opinião sobre tudo – e as expressemos em tempo real aos acontecimentos.
Sendo assim, o que significa “contemplar” em nosso tempo?
Nossa consciência da grandeza e do sublime está diminuindo cada vez mais, seja por essa agenda ou pelo tipo de educação que temos disponível, orientada para a performance.
Sertillanges completa a frase de abertura da seguinte forma: “A solidão interior e o silêncio são suas duas asas”.
Asas do espírito.
Esta é uma tentativa de apontar um caminho para todo aquele que deseja alcançar algo mais. E não nos referimos ao mundo externo, mas ao interno, onde devemos guardar os tesouros imensuráveis de nossa existência.
Sim! É outro paradoxo de nosso tempo, que a tudo precifica e induz ao ganho.
Mas será que existe uma fórmula para diminuirmos o passo e dedicarmos diariamente – ou semanalmente, quinzenalmente – um tempo para contemplar?
Não, não existe. Entretanto, compreender o significado de contemplação pode ajudar cada um a estabelecer o seu método.
O que é contemplação?
Quando ouvimos a palavra “contemplação”, nossa mente logo associa a outras palavras como “inspiração” ou “mágica”. Entretanto, não é nada disso de que se trata.
Para Plotino, as coisas contempladas tornam-se cada vez mais íntimas e unificadas com aquele que as contemplam.
Contemplação também pode vir a ser uma experiência religiosa, mas não é religiosa em sua essência.
É claro que existe contemplação como experiência mística, mas no sentido que tratamos aqui tem mais a ver com o refletir sobre nossa vida interior e o sentido de nossa existência.
Há pensadores que entendem a contemplação como a mais alta expressão da vida intelectual e espiritual. É a possibilidade de viver uma vida mais elevada.
Agora, como alcançar isso?
Estágios da contemplação
A contemplação enquanto um estágio está mais além do que o da reflexão e da meditação, uma vez que ambos estão mais para a ordem do exercício do pensamento.
A contemplação, de fato, está mais próxima de uma apreensão intuitiva, porque ela não tem a ver com qualquer verdade que possamos vir a descobrir a partir de uma ideia ou de um sistema. Ela apenas permite um estado de liberdade. É um reconhecimento.
Como é bastante difícil uma definição, talvez ajude tirar da frente o que não é contemplação.
Portanto, contemplar não é:
- Exercício do pensamento,
- Olhar vago,
- Transe,
- Êxtase,
- Sentar e ficar quieto por algum tempo,
- Buscar rituais religiosos,
- Fechar-se em si mesmo,
- Concentrar-se.
Muitos pensadores já escreveram sobre o assunto: Plotino, Espinoza, Schopenhauer, entre muitos outros.
E uma das coisas que Sertillanges escreve – embora mais orientado à vida intelectual – é algo bastante interessante e que cabe em nossa vida diária e moderna.
Trata-se do “estado de solidão”.
O que seria isso?
O estado de solidão é diferente da solidão como a conhecemos – ou do isolamento – algo que pode nos levar a uma falsa ideia de estado de solidão ou de falsa paz, como explica Sertillanges no livro A Vida Intelectual.
Para ele, é possível considerar “duas horas a salvo”. E essa solidão é “menos uma solidão de lugar do que uma solidão de recolhimento; ela é elevação mais do que afastamento”.
Para “estimular” o exercício da contemplação, é importante prestarmos atenção:
- No sublime,
- Na beleza,
- Na arte,
- No sagrado,
- No milagre,
- No lúdico,
- Nas dádivas.
Tudo isso sem o qual nossa vida seria prosaica e nossa alma vazia. Na mesma linha, é importante nos afastarmos:
- Do ceticismo,
- Do utilitarismo,
- Apenas das aparências,
Uma vida de contemplação não é fácil, mas é urgente tentarmos conquistá-la. E com um passo de cada vez e boas leituras, certamente é possível.
Para isso, conte com a É Realizações. Nossos títulos têm essa missão: alimentar não só o intelecto, mas também a alma.